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A intensificação da imigração européia tinha como objetivos suprir a mão-de-obra que o cultivo do café exigia e colonizar as terras férteis do sul do país. Além disso, os militares insistiam na colocação desses imigrantes também nas regiões da fronteira com o Uruguai, Argentina e Paraguai.

Em 1824 chegaram os primeiros alemães no vale do Rio dos Sinos, hoje São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. Em 1828, outras levas de europeus foram para São Pedro de Alcântara, em Santa Catarina, e para Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul. Novas imigrações vieram também ocupar espaços no interior de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.

Era inevitável que os indígenas reagissem ante a invasão de suas terras. Mas os brasileiros e europeus sempre entenderam essas reações como sinal de barbarismo e selvageria. O governo organizou tropas especiais para defender os moradores e pediu que os padres capuchinhos formassem missões para catequizá-los. Contudo, essas iniciativas mostraram-se insuficientes.

Os colonos também se organizaram, formando expedições para matar os indígenas. Alguns colonos inclusive se profissionalizaram, foram os chamados bugreiros, que eram pagos pela administração e por outros colonos. Em expedições punitivas, eliminavam a população nativa através do massacre ou de prisões, com o simples objetivo de “limpar a área”.
Xokleng
Homens Xokleng em foto posada, tomada em
estúdio para divulgação  do exotismo nacional.
Os Xokleng e os imigrantes europeus:
"Mais para o sul, nos Estados do Paraná e Santa Catarina, a floresta Atlântica, alcançando terrenos e clima subtropicais, assume uma feição nova com a crescente dominância da araucária. É a zona dos pinhais que prossegue pelo oeste e para o sul, já numa região de campos. Essa mata é o habitat de uma outra tribo Kaingâng, os Botocudos ou Coroados de Santa Catarina, conhecidos na literatura etnológica como Xokleng ou Aweikoma. Para evitar confusão com outros grupos homônimos, nós os chamaremo Xokleng...

Em meados do século XIX, largos trechos daquelas matas foram destinados a colonos alemães, italianos e eslavos trazidos ao Brasil por iniciativa governamental ou de empresas particulares...Aqui o colono europeu, depois de conduzido a seu lote, permanecia isolado com a família, muitas vezes a considerável distância dos vizinhos mais próximos...famílias, ilhadas na mata, tendo de construir com as próprias mãos, feitos da madeira das derrubadas, não somente a casa e o mobiliário mas todos os utensílios de que careciam, viam-se a braços ainda com o terror ao indígena armado de flecha e tacapes que vigiava todos os seus movimentos...nas matas de pinhais eles tiveram de enfrentar os indígens apenas com as idéias preconcebidas que traziam da Europa... viam em cada indígena uma fera perigosa pronta para atacar, o que impedia qualquer entendimento.

Após os conflitos que se seguiam a cada nova penetração, o pânico se apossava dos colonos; e grupos deles abandonavam a terra dirigindo-se a São Paulo, onde poderiam trabalhar em segurança, embora como assalariados, ou regressavam à Europa. Muito cedo o governo se viu compelido a tomar providências para estancar o êxodo dos colonos. A primeira delas foi destacar uma guarnição militar para expulsar os indígenas. A esta se seguiram outras medidas, através de todo o século XIX, sem que se conseguisse pôr fim aos conflitos. Além das guarnições, foram tentadas também, sem sucesso, as turmas de sertanejos armados para dar cabo dos indígenas, por conta do governo provincial, do município de Blumenau e das companhias de colonização. Falou-se muito também em tentar os meios persuasórios, através de civis e religiosos que se dispusessem a ir ao encontro dos indígenas, pacificamente, mas jamais alguém logrou sequer defrontar-se com eles.

Foi à força das armas dos próprios colonos e, sobretudo, enchendo a mata de bugreiros profissionalizados que a colonização prosseguiu pelo vale do Itajaí, levando a frente de lutas sempre para diante. Mas com o avanço da colonização estreitava-se cada vez mais o cerco das matas onde se refugiavam os indígenas e amiudavam-se os conflitos. Nos primeiros anos deste século, em plena vigência do regime republicano, todos os governos estaduais e municipais das zonas que tinham indígenas hostis, tanto o de Santa Catarina como o do Paraná, destinavam verbas orçamentárias especiais para estipendiar bugreiros. É certo que essas carnificinas causavam revolta em muitos lugares e levaram à criação de associações de amparo aos indígenas, mas nenhuma delas passou das pregações humanitárias. E estas pouco adiantavam, pois ninguém podia
convencer os colonos apavorados de que não podiam matar indígenas que, por vezes, também os matavam.

O dr. Hugo Gensch, médico de Blumenau e o mais notável desses indianistas, demonstrou que em cinqüenta e dois anos de existência daquela cidade, os indígenas haviam matado quarenta e quatro pessoas, tendo perdido nesse período um número incomparavelmente superior. Por exprimir tais opiniões, foi apelidado pelos colonos de bugervater (pai de bugre). O espírito humano tem certas exigências, e o colono precisava ver no indígena um animal feroz para poder caçá-la com a consciência tranqüila. A ele não se aplicavam as atitudes humanitárias, sentimentais, que aquela mesma gente demonstrava de tantos outros modos. O coro era praticamente unânime e ainda reforçado por jornais como o tristemente célebre Urwaldbote, de Blumenau, que pregava diariamente a chacina, demonstrando que os indígenas eram incapazes de evolução e que diante de uma raça superior, capaz de construir uma civilização naquelas matas, tinham mesmo de ser exterminados.

No meio desse cerco feroz, o indígena era compelido a um comportamento de fera. Esgueirava-se pela mata, procurando confundir-se com ela para não ser percebido; esquivava-se de todo encontro, e quando isto era impossível, sabia que sua única chance era matar primeiro. Não tinha pouso certo, perambulava sempre, evitando deixar qualquer rastro que denunciasse o rumo que tomava. Para as cerimônias em que vários bandos deviam reunir-se, cercava-se de todas as precauções, cavava profundas trincheiras e minava as imediações com fojos - buracos disfarçados com uma fina camada de gravetos e folhas que escondiam lanças e longos estrepes.

Nem assim se punha a salvo das chacinas levadas a efeito por facínoras especializados em bater as matas para descobri-la. Bastava o menor indício da passagem de um indígena por um lugar para os colonos ou criadores se juntarem em bandos bem armados e porem-se em seu encalço. E se a suspeita se confirmava, era chamado um bugreiro especializado para o ataque, sistematicamente planejado e levado a efeito com requintes de crueldade. O indígena era considerado fora-da-lei, seu assassinato era não somente impune, mas estimulado e reverenciado como obra meritória.

Em Santa Catarina, os bugreiros profissionais e até oficializados alcançaram tal eficiência em suas batidas que deixaram para trás, como meros amadores, os bandos de celerados que caçavam indígenas em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia. No relatório do inspetor do Serviço de Proteção aos índios, Eduardo de Lima e Silva Hoerhen, que, em 1910, retiraria das matas de Santa Catarina esses bugreiros profissionais, aquelas batidas são assim descritas:

Infinitas precauções tomam, pois é preciso surpreender os índios nos seus ranchos quando entregues ao sono. Não levam cães. Seguem a picada dos índios, descobrem os ranchos e, sem conversarem, sem fumarem, aguardam a hora propícia. É quando o dia está para nascer que dão o assalto. O primeiro cuidado é cortar as cordas dos arcos. Depois praticam o morticínio.
Compreende-se que os índios, acordados a tiros e a facão, nem procuram defender-se e toda heroicidade dos assaltantes consiste em cortar carne inerme de homens acobardados pela surpresa. Depois das batidas dividem-se os despojos, que são vendidos a quem mais der, entre eles os troféus de combate e as crianças apresadas.
Nos municípios de Araranguá e Tubarão existiam e existem, quiçá, os celebérrimos Veríssimo, Maneco Ângelo e Natal Coral, os três grandes capitães das batidas. Eram tidos como heróis e como tais, respeitados. Visitavam-nos, aplaudiam-nos e citavam seus nomes como se fossem de prestantes cidadãos.
Em Nova Veneza os morticínios levados a efeito por Natal Coral e Ângelo a mando do diretor da colônia foram numerosos. Em cada município onde existiam índios, havia os tais caçadores. Citamos os três indivíduos que se entregavam ao triste mister nos municípios do sul. Falemos, agora, do mais célebre de todos: o famigerado Martinho Marcelino ou Marcelino Bugreiro, o homem pago pelos governos estaduais para dizimar os Xokleng. Conseguiu reunir pequena fortuna com a sua profissão; sua fama estendeu-se pelo Estado e, desse modo, mandavam-no chamar, gratificavam-no principescamente para levar aos índios o terror, para aprisionar crianças, para vender armas e utensílios indígenas.
Nos seus diferentes ataques, matou mais índios do que todos os outros bugreiros reunidos. Só numa dessas batidas, quando foi aprisionada a menina Korikrã, junto a onze outras crianças, morreram centenas de pessoas de todas as idades e sexos.”'

Fontes :  Brasil Indígena: 500 anos de resistência / Benedito Prezia, Eduardo Hoomaert. - São Paulo: FTD, 2000
Os Xokleng e os imigrantes europeus in Os Índios e a Civilização / Darcy Ribeiro. - São Paulo : Circulo do Livro, sem data


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