No tempo em que
somente os bichos
povoavam a terra, as funções que hoje são
desempenhadas pelos homens eram desempenhadas pelos bichos.
O Jaguar, por ser muito valente, era o
delegado de polícia; o Quero-quero era sentinela, o
João-de-Barro era construtor de casas e assim por diante.
O Avestruz, por ter as pernas compridas
e ser muito rápido, era carteiro. Sim carteiro. Lá ia
ele, de ranchinho em ranchinho, levando cartas.
Certa ocasião, a mulher do
Avetruz estava chocando ovos, dos quais nasceram uns avestruzinhos
muito bonitinhos. Mas a mulher do Avestruz adoeceu.
Então, o marido foi à
venda do Capincho, buscar remédio para a mulher que não
podia sair de casa, pois precisava estar chocando os ovos.
Na venda, que era um ambiente de gente
meio vagabunda, estavam festejando a chegada de um Tangará
muito cantador, tocador de viola, que tinha vindo de Cima da Serra.
A festa se animou quando o Tangará
começou a trovar em desafio com o Anu, que era também
muito cantador.
O Avestruz – que tinha ido lá
somente para buscar o remédio para a mulher – começou
a se entusiasmar com a festa, bebeu cachaça, se embebedou, só
acordou no dia seguinte, quando o sol já estava alto.
Só então se lembrou da
mulher. Comprou o remédio e voltou depressa, o quanto a perna
dava.
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Mas quando
chegou à casa a
mulher tinha morrido. Louco de remorso, o Avestruz pôs-se sobre
os ovos para terminar de chocá-los. Um tempo depois, nasceram
os filhotes, mas piando muito tristes, porque não tinham mãe,
eram guaxos.
E desde aí – para que se
lembrem dos deveres de família – os avestruzes passaram a
chocar os ovos, isto é, o macho é que choca e não
a fêmea. É a mesma coisa que se, num galinheiro, o galo
fosse para o chôco e a galinha ficasse cantando: co-co-ro-có.
...
para que se lembrem dos deveres de
família
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